Parentes misteriosos dos primeiros humanos chegaram a Sulawesi há mais de um milhão de anos

A descoberta, feita por pesquisadores da Universidade Griffith, na Austrália, e da Agência Nacional de Pesquisa e Inovação da Indonésia (BRIN), foi publicada na revista Nature. Os cientistas, liderados conjuntamente pelo professor Adam Brumm, do Centro Australiano de Pesquisa em Evolução Humana da Universidade Griffith, e pelo arqueólogo indonésio Budianto Hakim, encontraram sete artefatos de pedra em Calio, um sítio no sul de Sulawesi, durante trabalhos de campo realizados entre 2019 e 2022.
Os artefatos — pequenas lascas afiadas de pedra-sílex (chert) — foram produzidos por lascamento por percussão, um processo em que se golpeiam seixos maiores para criar ferramentas cortantes. Uma das lascas chegou a apresentar indícios de retoque para formar uma borda de corte mais afiada. As ferramentas teriam sido usadas para processar alimentos ou confeccionar instrumentos a partir de madeira ou material vegetal, mas, até agora, não foram encontrados ossos de animais com marcas de corte.
Técnicas de datação, incluindo análise paleomagnética das camadas de arenito e datação por série de urânio e ressonância de spin eletrônico de um dente molar fossilizado de porco, indicaram que as ferramentas tinham pelo menos 1,04 milhão de anos — e possivelmente até 1,48 milhão de anos. Isso as torna o registro documentado mais antigo da presença de hominíneos em Wallacea — um arquipélago entre as plataformas continentais australiana e asiática —, anterior a descobertas comparáveis na ilha filipina de Luzon (aproximadamente 700 mil anos) e no próprio sítio de Talepu, em Sulawesi (cerca de 194 mil anos).

“Essa descoberta amplia nossa compreensão sobre o deslocamento de humanos extintos através da Linha de Wallace, uma zona de transição além da qual espécies animais únicas — e muitas vezes bastante peculiares — evoluíram isoladamente”, disse o professor Brumm. “É uma peça importante do quebra-cabeça, mas o sítio de Calio ainda não revelou nenhum fóssil de hominíneo. Portanto, embora agora saibamos que havia fabricantes de ferramentas em Sulawesi há um milhão de anos, sua identidade permanece um mistério.”
Dada a idade das ferramentas, os pesquisadores estão convencidos de que elas foram produzidas pelo Homo erectus, que se acredita ter se espalhado para a vizinha Java por volta de 1,6 milhão de anos atrás, ou por um de seus parentes próximos, como o Homo floresiensis, de pequeno porte. Brumm acrescentou ainda que sua equipe acredita que os hominíneos de Flores podem ter se originado em Sulawesi antes de se espalharem para o sul.

A descoberta também levanta questões sobre como esses humanos antigos se adaptaram à vasta e ecologicamente rica paisagem de Sulawesi. “Sulawesi é uma incógnita — é como um mini-continente em si”, disse Brumm. “Se os hominíneos ficaram isolados nessa enorme ilha por um milhão de anos, será que teriam passado pelas mesmas mudanças evolutivas que os ‘hobbits’ de Flores? Ou teria acontecido algo totalmente diferente?”
Embora Sulawesi já seja famosa por abrigar a mais antiga arte rupestre narrativa conhecida no mundo — com mais de 51.200 anos —, as novas descobertas sugerem que a ilha possui uma história de ocupação por humanos primitivos muito mais antiga, de uma época em que os primeiros hominíneos conseguiram realizar impressionantes façanhas marítimas, cruzando canais oceânicos profundos muito antes do surgimento dos humanos modernos.
Mais informações: Universidade Griffith
Publicação: Hakim, B., Wibowo, U.P., van den Bergh, G.D. et al. (2025). Hominins on Sulawesi during the Early Pleistocene. Nature. doi:10.1038/s41586-025-09348-6