Dentes de 300.000 anos sugerem cruzamento entre humanos primitivos e Homo erectus.

A pesquisa, publicada no Journal of Human Evolution, é resultado de uma colaboração internacional entre o Instituto de Paleontologia de Vertebrados e Paleoantropologia (IVPP), em Pequim, e o Centro Nacional de Pesquisa sobre a Evolução Humana (CENIEH), na Espanha. Os pesquisadores, liderados pela professora Wu Xiujie, diretora das escavações em Hualongdong, analisaram 21 elementos dentários, incluindo 14 ainda inseridos em um crânio bem preservado, descoberto entre 2014 e 2015 na Província de Anhui.
O que eles descobriram foi uma surpreendente mistura anatômica. Os dentes apresentam uma combinação de características modernas — como terceiros molares pequenos e superfícies bucais lisas — com traços arcaicos, como raízes robustas em molares e pré-molares, características mais comumente associadas ao Homo erectus. Isso reflete análises esqueléticas anteriores dos hominídeos de Hualongdong, que exibiram traços faciais típicos do Homo sapiens, mas morfologia dos membros e da mandíbula mais parecida com a do H. erectus.
“É um mosaico de traços primitivos e derivados nunca antes visto — como se o relógio evolutivo estivesse avançando em velocidades diferentes em partes distintas do corpo”, explicou María Martinón-Torres, diretora do CENIEH e coautora do estudo. Seu colega, o paleobiólogo José María Bermúdez de Castro, afirmou: “A descoberta de Hualongdong nos lembra que a evolução humana não foi linear nem uniforme, e que a Ásia abrigou múltiplos experimentos evolutivos com resultados anatômicos únicos.”

Significativamente, os dentes de Hualongdong não apresentam as características típicas dos neandertais, o que indica que esse grupo era distinto tanto dos neandertais quanto dos denisovanos. Isso levou os cientistas a proporem algumas explicações para sua combinação incomum de traços. Uma possibilidade é o fluxo genético ou cruzamento entre um grupo inicial semelhante ao Homo sapiens e uma espécie mais arcaica, como o Homo erectus. Outra hipótese é que a amostra de Hualongdong pertença a uma linhagem especial, relacionada diretamente aos humanos modernos, mas separada de qualquer espécie conhecida.
Essa combinação de características desafia antigas classificações evolutivas e reforça a ideia de que a diversidade de hominídeos na Ásia era muito maior do que se imaginava anteriormente.

A descoberta em Hualongdong é uma entre um número crescente de achados que sugerem que o continente asiático foi um centro evolutivo de experimentação no Pleistoceno Médio. Outras descobertas recentes — como o Homo luzonensis nas Filipinas (2019), o Homo longi no norte da China (2021, atualmente considerado denisovano) e o Homo juluensis da China (2024) — complicam ainda mais a árvore genealógica humana. Algumas dessas espécies viveram entre 300.000 e 150.000 anos atrás, o mesmo período em que os hominídeos de Hualongdong viveram.
Apesar da antiguidade dos fósseis, os dentes de Hualongdong compartilham muitas características derivadas com hominídeos do Pleistoceno Tardio e até mesmo com humanos modernos. Isso inclui um contorno oclusal semelhante ao humano e padrões avançados de sulcos nos pré-molares, sugerindo que alguns traços modernos já começavam a surgir na Ásia muito antes da disseminação mundial do Homo sapiens.
A descoberta também ressalta a importância de sítios asiáticos menos documentados, como Panxian Dadong e Jinniushan, que, assim como Hualongdong, apresentam combinações de características que não se encaixam facilmente nas categorias atuais de espécies.
Embora os cientistas ressaltem que são necessárias mais evidências para determinar a identidade precisa e a posição evolutiva dos hominídeos de Hualongdong, o achado representa um avanço importante para iluminar a complexa história evolutiva da nossa espécie na Ásia.
Mais informações: CENIEH
Publicação: Wu, X., Martinón-Torres, M., Xing, S., Pei, S., Cai, Y., Tong, H., … Liu, W. (2025). The hominin teeth from the late Middle Pleistocene Hualongdong site, China. Journal of Human Evolution, 206(103727), 103727. doi:10.1016/j.jhevol.2025.103727