Dentes de crianças maias com incrustações de jade revelam prática antiga rara

Modificações dentárias, como gravações, desgastes e incrustações, eram comuns entre os antigos maias durante os Períodos Clássico e Pós-Clássico (250–1550 d.C.). Utilizando ferramentas de pedra, artesãos abriam cavidades nos dentes e inseriam gemas moldadas — geralmente jade, obsidiana ou pirita — fixadas com um cimento orgânico. Essas práticas eram realizadas principalmente em adultos e, segundo pesquisas anteriores, não começavam antes da adolescência. Estudos da arqueóloga Vera Tiesler indicam que até 60% dos adultos apresentavam esse tipo de modificação.
O aspecto surpreendente da nova descoberta é que os dentes pertenciam a crianças de 8 a 10 anos. Foram identificados um incisivo central superior esquerdo, um incisivo lateral inferior e um canino superior direito. Estima-se que uma criança tinha entre 9 e 10 anos na época da morte, enquanto as outras duas tinham entre 8 e 9 anos. Não se sabe se os incisivos pertenciam a um mesmo indivíduo ou a dois diferentes, mas a variação na habilidade do trabalho indica que mais de uma pessoa realizou os procedimentos.
Segundo o Phys.org, o Dr. Andrea Cucina, coautor do estudo, explicou: “Esses dentes… são dentes soltos que foram doados ao Museu”. Ele acrescentou que não há informações sobre sua procedência, registro tafonômico ou status social. Contudo, a análise confirmou que as incrustações foram feitas em vida, já que os dentes apresentavam respostas biológicas, como a formação de dentina protetora ao redor das cavidades.

A precisão do trabalho variava consideravelmente. O incisivo inferior apresentava o artesanato mais cuidadoso, com a cavidade limitada apenas ao esmalte. Já a incrustação do incisivo central superior atingia a dentina, mas não chegava à câmara pulpar. Essas diferenças podem refletir a atuação de mais de um artesão — ou o tratamento de crianças diferentes.
Até agora, o único outro caso envolvendo uma criança com incrustações dentárias era o de um indivíduo de três a quatro anos encontrado em Pusilha, em Belize. Nesse caso, as incrustações foram feitas após a morte, provavelmente como parte de um ritual funerário. Já os exemplos da Guatemala foram claramente realizados em vida, representando, assim, os indivíduos mais jovens conhecidos com esse tipo de modificação.
Por que crianças maias teriam recebido um procedimento mais comum em adultos? Os pesquisadores são cautelosos. Eles sugerem que pode ter sido uma tradição regional e localizada. Outra hipótese é que a prática estivesse ligada ao alcance da maturidade social. Por volta dos 10 anos, crianças maias começavam a assumir responsabilidades adultas, como as meninas nos afazeres domésticos e os meninos no trabalho nas milpas (lavouras). Nesse contexto, as incrustações de jade poderiam marcar a transição da infância para a vida adulta.
Embora o significado exato dessas modificações ainda seja um mistério, a descoberta abre novas possibilidades para compreender a sociedade maia. Esses achados incomuns sugerem que a arte dentária maia não era tão restrita por idade quanto se acreditava.
Mais informações: Ramírez-Salomón, M., Mata-Castillo, E., Monsreal-Peniche, M. B., Luin, C., Klee-Bueso, H., Cucina, A., & Vega-Lizama, E. (2025). Incrustações dentárias maias pré-hispânicas em dentes com ápices abertos: implicações para a idade das práticas culturais. Journal of Archaeological Science: Reports, 67(105353), 105353. doi:10.1016/j.jasrep.2025.105353